Vitorianas Macabras: a voz feminina da Era Vitoriana em 13 contos de terror

Vitorianas Macabras foi uma leitura que me agradou bastante e não exagero ao afirmar que foi a melhor leitura de contos que fiz neste ano, até agora. Reunindo treze grandes escritoras da Era Vitoriana, dentre elas Charlotte Bronte, Violet Hunt e Violet Page, o livro executa muito bem sua missão de dar voz a essas mulheres e nos contempla com narrativas instigantes, prazerosas e assustadoras. Como escreveu Marcia Heloísa no prólogo deste livro: "Quando pensamos no limitado escopo de atuação concedido às vitorianas, a trajetória das treze autoras aqui reunidas se torna ainda mais extraordinária".

​Uma das características mais ​interessantes​ na antologia é que todos os contos têm o elemento "relato" muito marcante. Durante a leitura, tive a sensação de que o narrador-personagem estava ao meu lado tomando um conhaque ou um chá (a depender do conto) me contando, com pavor e certeza, os detalhes de suas experiências macabras. Fui tomada, então, por sentimentos de desconfiança, medo, reflexão e até repulsa.

Dentre todos os contos, o que mais me chamou a atenção foi "A Prece", de Violet Hunt. Nele, ao perder o marido, a mulher faz uma prece para que ele ressuscite. Seu pedido é atendido, mas aquele que volta dos mortos, jamais permanece o mesmo. Os elementos fúnebres que compõem o conto me deram arrepios e a atmosfera era tão mórbida que eu fui atingida por um forte sentimento de luto e impotência. Além disso, a situação deprimente da mulher ao lado de morto-vivo, nas palavras de Violet Hunt, teve uma conotação similar às vítimas de relacionamentos abusivos.

"Ela só sai de cada para ir à missa; nunca faz visitas nem é visitada por ninguém. Ninguém convida os Arne para jantar, o que é compreensível... imagine ter aquele homem à mesa, arruinaria qualquer refeição. Eles também nunca dão festas. Ela está sempre sozinha. Dia após dia, encontro-a sentada diante da lareira, com a mesmíssima expressão de preocupada no rosto. Não me espantaria nem um pouco que se enlouquecesse de uma hora para outra. Pai, o que ela tem? Qual a tragédia daquela casa? Com certeza existe uma."

"Se o senhor soubesse o alívio que é sair de casa, como me sinto menos infeliz aqui fora! Aqui posso respirar, posso viver... só assim vislumbro um mundo vivo, pulsante... eu moro em um mausoléu."

O prefácio escrito por Marcia Heloísa traz informações de muita importância sobre a Era Vitoriana, principalmente no que se refere ao impacto da Rainha Vitória na sociedade. Um dos questionamentos que ela levanta é: "Em uma Era que nos deu tantas mulheres formidáveis, por que reverenciamos apenas os homens?". Vale muito a pena ler o texto do início ao fim.

"Depois de casadas, esmeravam-se para cuidar da casa, do marido e dos filhos. O divórcio não era uma opção, tanto por motivos religiosos como jurídicos. As mulheres eram consideradas propriedades legais de seus maridos. A esposa sofrida que escapava de um marido abusivo, por exemplo, perdia todos seus direitos, bem como a guarda dos seus filhos. Por esse motivo, diversas mulheres se submetiam a casamentos infelizes , maus-tratos, infidelidades e violências sexuais. E mesmo as poucas que conseguiam o divórcio por um ato do Parlamento (opção disponível somente para as extremamente ricas), eram banidas do convívio social." — Prólogo, por Marcia Heloísa.

Vitorianas Macabras, para mim, é muito mais do que um livro de contos de terror: É a junção de vozes poderosíssimas que precisaram e continuam precisando ser ouvidas. Toda história tem uma bagagem e, aqui, eu pude conhecer mais mulheres fortes e corajosas para me inspirar. Minha única crítica negativa é com relação a ausência de mulheres negras na antologia. Em uma época em que muitas mulheres escreviam sob pseudônimos masculinos para serem publicadas, para as mulheres negras essa realidade era ainda mais difícil... E essas vozes também precisam ser ouvidas.

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