"Estávamos guardando os segredos de quem, afinal?" | Rede de Sussurros, de Chandler Baker

"Se vocês tivessem escutado a gente, nada disso teria acontecido."

É com essa impactante frase no prólogo que Chandler Baker começa a história e nos apresente a um grupo de mulheres: Slone, Ardie e Grace, advogadas que trabalham na Truviv, uma empresa de representação esportiva. Ocupando um cargo de grande poder na empresa, Sloane passa por situações desconfortáveis  unicamente por ser mulher em um ambiente de trabalho com a maioria de seus funcionários do sexo masculino. E, infelizmente, Sloane não é a única. Tendo que ignorar comentários desnecessários, olhares desdenhosos e insinuações desrespeitosas, Ardie e Grace também estão na mesma situação.

Nesse contexto, a história de Rede Sussurros começa no momento em que o CEO da Truviv morre e o nome mais forte para ocupar a presidência da empresa é Ames Garret, um homem acostumado a assediar e chantagear mulheres. Preocupadas com a situação e com a terrível possibilidade de Ames continuar a assediar outras mulheres, as três amigas se fortalecem juntas para mudar a triste realidade em que vivem.

"É claro, não podemos nos esquecer dos homens bons: aqueles que riam das nossas piadas e pediam nossos conselhos sobre a redação de um texto, que não encaravam a maternidade como um problema, que tinham esposas com empregos exigentes, que se encarregavam de parte do trabalho doméstico, que eram felizes no casamento ou gays. Eles não iniciavam as reuniões reclamando de remakes de filmes com elenco inteiramente feminino nem nos pediam que atendêssemos a um único telefonema durante a licença-maternidade. Mas mesmo os bons — ou especificamente os bons? — fingiam não notar as diferenças: como eram tratados com mais deferência ao telefone por terem voz masculina Ou como sua altura, seu tamanho e sua barba por fazer davam um peso autoritário às suas ideias que as nossas nunca tinham. Se chamavam sua atenção para isso, os homens bons desconsideravam essas observações com um constrangimento humilde e nos diziam como éramos mais inteligentes do que eles. Eles eram nossos colegas e alguns até nossos amigos. Mas as diferenças de fato existiam. E não apenas na nossa cabeça."

Ler Rede de Sussurros foi uma experiência incrível, dolorosa e reconfortante. Ao mesmo tempo em que consegui me enxergar em algumas situações e relembrar coisas extremamente indigestas que já ouvi em ambientes de trabalho, pude sentir a esperança de um novo tempo em que estamos vivendo, um tempo que nós, mulheres, nos ajudamos e — finalmente — estamos parando de sussurrar e começando a falar alto.

"Estávamos guardando os segredos de quem, afinal? Os nossos ou os deles? Que interesses eram protegidos pelo nosso silêncio?"

 

Uma das coisas mais interessantes em Rede de Sussurros é que o livro aborda nitidamente o movimento #MeToo (página oficial do movimento: https://metoomvmt.org/) que ganhou notoriedade nas redes sociais com várias mulheres quebrando o silêncio sobre situações de assédio e abuso sexual. Com uma narrativa guiada pelo suspense e instigando a nossa curiosidade de saber como será o desfecho, Chandler Baker construiu uma narrativa brilhante abordando temas importantíssimos dentro do feminismo e colocando uma grande exclamação de alerta na mente de seus leitores.

 

"Um homem podia dizer que ia tirar o dia de folga para pescar com o filho, enquanto para uma mãe, em geral, era melhor esconder o fato de que tinha estendido a hora do almoço para levar a criança ao médico. Filhos transformavam os homens em heróis e as mulheres em funcionárias inferiores, se não fizéssemos tudo certo."